De maneira geral, a resistência a LMs pode ser
observada em quase todos os rebanhos avaliados. Algumas características são
comuns a quase todos os relatos e permitem traçar um perfil da resistência aos
anti-helmínticos no Brasil.
As formulações comerciais de SA e LEV, ainda
apresentaram-se eficazes na maioria dos rebanhos avaliados, até mesmo naqueles
em que foi relatada resistência à IVM (Soutello et al., 2007; Souza et al.,
2008; Cezar et al., 2010; Feliz, 2011). Este efeito pode ser justificado por
dois fatores que diferem estes princípios ativos das LMs: menor comercialização
e período residual. Formulações anti-helmínticas com tempo de permanência
plasmática prolongado permitem o estabelecimento de larvas resistentes, sua
reprodução e eliminação de ovos ao ambiente, ao mesmo tempo em que os parasitos
susceptíveis são eliminados, acelerando o processo de seleção de parasitos
resistentes (Dobson et al., 2006).
Outra característica comum foi o predomínio dos
gêneros Cooperia e Haemonchus com resistência a LMs. Porém,
os princípios ativos pertencentes a este grupo químico devem ser analisados isoladamente
em cada propriedade rural, pois ainda pode ser observada eficácia de
determinadas moléculas contra populações de parasitos resistentes. De modo
geral, as populações de nematoda resistentes a IVM foram também resistentes à
DORA (Rangel et al., 2005; Mello et al.,
2006; Cardoso et al., 2008; Cezar et al., 2010; Costa et al., 2011; Feliz, 2011).
Por outro lado, algumas populações de parasitos resistentes às avermectinas
mostraram-se ainda susceptíveis à MOX (Acuña e Paiva, 2000; Rangel et al.,
2005; Soutello et al., 2007; Feliz, 2011; Almeida, 2011). Embora pertençam ao
mesmo grupo químico, diferenças na estrutura química das moléculas de IVM e MOX
podem justificar as diferenças na susceptibilidade dos parasitos. Ardelli et al. (2009)
demonstraram importantes diferenças quantitativas e qualitativas na
resposta de Caenorhabditis
elegans a IVM e MOX, indicando diferenças no comportamento
de L3 expostas às
mesmas concentrações destas moléculas na indução da expressão de genes que codificam subunidades do canal de
cloro ativados por glutamato (GluCl), o princiapl receptor das LMs, e no efeito destas moléculas
em estirpes de subunidade GluCl knockout desse
nematoda. Além destas diferenças
no local de ação, a
glicoproteína-P, que está relacionada com o mecanismo de resistência de nematodas a LMs
(Xu et al., 1998), tem afinidade
mais baixa à MOX do que à IVM (Lespine et al, 2007),
além de haver número maior de proteínas
capazes de remover IVM do que MOX (Roulet e
Prichard, 2006).
No Brasil, uma das medidas adotadas pela indústria
farmacêutica foi o aumento da concentração dos endectocidas, medida que tem sido
discutida pela comunidade científica porque altas concentrações podem resultar
em maior pressão de seleção de parasitas resistentes, uma vez que poderia matar
todos os homozigotos susceptíveis e/ou todos heterozigotos (Smith et al. 1999).
Os
resultados obtidos em alguns experimentos demonstram que uma vez estabelecida a
resistência a um princípio ativo, o aumento da dose administrada pode não resultar
em aumento de eficácia (Borges et al, 2005; Cezar et al., 2010; Costa et al.,
2011).
A frequência de
tratamentos anti-helmínticos para controle da verminose bovina parece seguir um
padrão comum em muitas propriedades rurais brasileiras. Soutello et al. (2007)
relataram as seguintes frequências (%) do número de tratamentos anuais: um (4%),
dois (56%), três (32%) e quatro (8%), em um total de 25 propriedades avaliadas.
A maioria dos tratamentos ocorreu em maio e novembro, época das vacinações
obrigatórias contra a Febre Aftosa. Portanto, a frequência de tratamentos não é
tão elevada a ponto de justificar a grave situação de resistência a ivermectina
observada neste estudo.
A resistência
aos anti-helmínticos tornou-se um desafio a mais para a comunidade científica
brasileira, que a curto e médio prazo precisa resolver duas importantes
questões: recomendações práticas e confiáveis de medidas que retardem o
processo de seleção da resistência e metodologias confiáveis e aplicáveis em
larga escala para o diagnóstico precoce da resistência. O tratamento seletivo,
amplamente recomendado para pequenos ruminantes (van Wyk et al., 2006) e cujo
objetivo é manter a população em refugia,
ainda não pode ser empregado em criações de bovinos nas condições brasileiras.
O outro desafio é o desenvolvimento de métodos com maior acurácia, praticidade
e sensibilidade para o diagnóstico da resistência. A maioria dos trabalhos
realizados no Brasil empregou o FECRT, que apresenta sérias limitações. Feliz
(2011) não conseguiu empregar esta metodologia em três propriedades rurais,
pois não havia número suficiente de animais com contagens de OPG satisfatórias.
O mesmo problema foi observado nos trabalhos de Mello et al. (2006) e Soutello
et al. (2007), nos quais ficou nítida a limitação do FECRT em bovinos,
destacando-se o reduzido número de animais por grupo e/ou baixas médias de OPG
antes do tratamento. Outro problema desta técnica é a reduzida acurácia, pois
os percentuais de eficácia podem ser superestimados pelo FECRT, quando
comparado ao teste anti-helmíntico controlado (Condi et al., 2009).
Uma vez gerados
os conhecimentos e tecnologias necessários, o último, e talvez maior, desafio será
a utilização destas recomendações a campo. Dois estudos em que foram aplicados
questionários aos produtores rurais ilustram esta situação. Souza et al. (2008)
observaram que os principais critérios para a escolha do anti-helmíntico são o preço,
propaganda e recomendação de vendedores. Delgado et al. (2009) realizaram
entrevistas em 1.304 propriedades rurais em Minas gerais e concluíram que as medidas
de controle de verminose bovina utilizadas pelos proprietários não seguem as
recomendações técnicas verminoses recomendadas.
Conclusões
Pode-se
considerar que o problema da verminose em bovinos está mais grave do que
décadas atrás, pois observa-se o aumento da intensidade parasitária por
espécies mais patogênicas, como H. placei,
e a redução da susceptibilidade aos anti-helmínticos. A resistência de Cooperia spp. e Haemonchus spp. a IVM e DORA está presente em quase todos rebanhos
bovinos brasileiros, enquanto LEV, SA e MOX ainda podem apresentar elevados
percentuais de eficácia.
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